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ODE AO SOL DA MEIA NOITE

Foto do escritor: Bárbara BritoBárbara Brito

Há um piano sobre meu peito.


Silenciosamente, faço-lhe um pedido, por favor. Afinal, é o que me resta.

Após um pigarro e um breve estalar de dedos, ouço a primeira nota ressoar e já me sinto desmanchar, do jeitinho que a chuva desmancha quando toca o mar. Olho através da janela; vejo que além da escuridão, tenho a lua, as estrelas e agora também um Sol. De tecla em tecla, vai surgindo uma canção.


Canção que é delicada e encantadora como copo-de-leite, e doce e entorpecente como copo de leite. Canção que é como cama quentinha, como travesseiro que afunda cabeça cansada e como cobertor macio tricotado por uma avó. Canção que é como estória, daquelas utópicas e inevitavelmente envolventes, contada por um avô. Canção que é como colo de uma mãe, que me embala enquanto mergulha os dedos finos nas ondas escuras e misteriosas dos meus cabelos. Canção que é como mão de um pai, que se estende em um convite para uma dança e logo me conduz graciosamente pelo céu iluminado, de nuvem em nuvem — ou seriam longos tufos de algodão doce? — sem jamais me deixar despencar, por mais que eu tenha tendência a me desequilibrar.


Canção que nada diz, mas, ao mesmo tempo, tudo diz! Canção que é sombria e reluzente como uma garota entre quatro paredes, que repete para si mesma que vai ficar tudo bem, vai ficar tudo bem, vai ficar tudo bem… até se exaustar a ponto de finalmente repousar. Canção que é a sonificação da dor, do amor, da esperança e do sublime. Canção que faz sonhar! Os sonhos mais liiindos, que nem os da outra canção. Canção que me faz lembrar que eu tenho a escuridão, a lua, as estrelas, um Sol, o Dó, o Ré, o Mi, o Fá, o Lá, o Si… e cada uma de suas variações, canção que traduz minhas orações. Há um piano sobre meu peito… mas já deixou de pesar. Porque eu tenho uma canção, o que mais eu poderia desejar?!


Canção essa que me abriu um sorrisinho — fraco, mas repleto de força, em meio a poças de águas salgadas, poças que começaram a secar desde o momento em que comecei a escutar. Canção que ampara, que acalenta; canção que acalma. Canção que eu poderia ouvir para todo o sempre, mas que uma vez só já foi suficiente para aquecer a frieza que assolava a minh’alma.

Canção a qual pertenço e que me pertence, minha composição.


E o pianista… é o meu coração.


Observações da autora: este texto foi escrito em Setembro de 2017. Durante uma crise de ansiedade, senti um peso enorme no meu peito, como se ali houvesse um piano. Então, imaginei suas teclas sendo tocadas e o ressoar de uma música para me acalmar.

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