(Quer dizer: “Eu sou brilhante, má e um pouquinho doida!”)
Esta citação de Cruella me impactou, me inspirou, falou comigo — e até por mim. A protagonista passa a reprimir o melhor de si para agradar os outros e se encaixar (o cliché que muitas de nós vivemos). Ela era uma garotinha excêntrica e muito talentosa, que só queria poder se expressar e se defender daqueles que ridicularizavam sua autenticidade e a rejeitavam, mas nãaao, não pode, não, afinal, boas meninas não devem se impor, né?!
Após ser repreendida pela mãe (que pensou estar protegendo a filha) e por conta do amor que sentia por ela, a menina se dividiu entre Ella, representando o que a sociedade espera de nós, mulheres, que sejamos “boazinhas” e “comportadas”, e Cruella, que acabou se tornando sua pior faceta pela crença de que esta era ruim, em vez de aprender a lidar com ela e direcionar para o que é positivo.
A fala que eu trouxe como título foi dita pela nossa anti-heroína em seu momento de conexão com seu verdadeiro eu; ao se reconhecer, se aceitar e, o mais importante, se integrar. Afinal, ela não é boa ou má, ela é ela. Uma mulher com problemas, traumas, pontos a serem trabalhados para evoluir como ser humana, é claro, mas também cheia de inteligência, força, determinação, coragem, ousadia, criatividade e muito o que agregar ao mundo com seu enorme poder criativo.
Eu me identifiquei porque, de certa forma, se encaixa na minha própria história, em especial nessa fase que estou vivendo agora aos 20 e não-tão-poucos-anos-assim.
Vamos por partes…
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Brilhante? Eu? (*síndrome de impostora modo ON*)
Sim, eu! (*7 anos depois de terapia*)
Eu literalmente já ouvi “você brilha!” e muitos outros elogios pelas coisas que eu faço (não só da minha família, ok?) e agradeço. Sério, meu “muito obrigada!” agora é genuíno. Com o tempo se tornou mais fácil (menos desconfortável) aceitar elogios e de fato acreditar neles. Mas, olha, foi um looongo caminho para mudar a minha percepção sobre mim mesma e me enxergar de forma mais realista (com tendência otimista). O que eu quero dizer com isso? A mente mente!
O meu perfeccionismo, autocrítica e tendência horrível à autodepreciação já me colocaram para baixo, lá no fundo do poço com a Samara, muitas vezes! Eu era a primeira a me pressionar e a me fazer críticas absurdas por conta de expectativas irreais (toca Boa Sorte da Vanessa da Mata aí!). E acabava projetando isso em tudo, em todos. Achava que todo mundo ia perceber o mesmo que eu, ia pensar o mesmo que eu. Que eu não era boa o suficiente e não fazia nada direito. Ainda acontece, na real, porém, com menos frequência e passei a racionalizar mais rápido; consigo me reerguer com autocompaixão e honra à minha trajetória. Estou desconstruindo meu padrão inalcançável de qualidade e reconhecendo que já fiz muito, sim!
Pode ser que algumas pessoas não enxerguem isso ou apenas não gostem de mim e das minhas escolhas, mas compreendi que mesmo se eu tivesse a aprovação de todas as pessoas do mundo sobre o que eu penso, sinto, falo, faço e crio; sem a minha própria validação, de nada adiantaria. Então, venho trabalhando em mim mesma para ter consciência dos meus pontos fortes e fracos. Para ter a humildade de errar e tentar de novo. Para assumir quem eu sou em minha totalidade e sentir orgulho.
E dizer com convicção que, sim, eu brilho!
Quando sou verdadeira comigo mesma e faço o que eu amo, você pode até ver no meu rosto, nos meus olhos. Eu brilho para caramba!
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Má.
Eu não! Peguei o papel da Boazinha.
A calada, a quietinha, a obediente. A que não dá trabalho, a que não incomoda, a que quer agradar. A que quer estar bem com todo mundo, a que não consegue dizer “não”, a que se anula pelos outros. A fofa, a meiga, a compreensiva. A que tenta justificar o injustificável se agarrando ao lado “bom” das pessoas (que muitas vezes não passa de uma idealização). A que tanto deseja ser amada.
Eu pensei que esse era o melhor papel. Até que eu me perdi nele.
Assim como perdi as contas do quanto já me prejudiquei por isso.
A verdade é que eu era muito medrosa, insegura e dependente emocionalmente. O que eu mais temia era a solidão. Então, nas minhas relações, me moldei a partir do que esperavam de mim. Achei que era assim que eu tinha que ser para receber amor, para ser aceita, para ter um lugar à mesa. Coloquei em mãos alheias a minha autoestima, as minhas escolhas, a minha felicidade. Dei poder a outras pessoas e suas vozes, abafando a minha própria. Claro que ia dar m*rda! Porque no fim das contas, eu que estava na minha própria pele vivendo as consequências.
E elas vêm com tudo!
Ser a Boazinha me causou frustração, ressentimento e me fez me sentir mais sozinha (a tal da ironia). Acabei me desconectando dos outros e de mim mesma porque eu me manipulei, eu me traí, eu preferi que doesse em mim para proteger ou agradar os outros. Ultrapassei os meus próprios limites. Fiquei confusa sobre minha identidade. O que eu gosto? O que eu não gosto? O que eu quero? O que eu não quero?
Quando me toquei que interpretava esse papel, desmoronei. Mas graças a Deus, porque eu entrei em uma etapa essencial para a minha jornada: a de olhar para dentro, me encarar. Eu me vi, crua. E doeu. Sempre dói. Ao mesmo tempo, viver a minha verdade traz paz. Eu sempre quis isso, mas acho que não sabia como. Sendo a Boazinha, tinha essa inquietação no meu peito, no fundo, eu sentia que não era certo. Busquei me adaptar para sobreviver (falando da minha saúde mental), ainda mais sendo uma pessoa muito sensível ao mundo, só que sempre pulsou em mim essa vontade de ser autêntica. E é a melhor coisa! Porém, em algumas situações, isso vai te fazer a vilã.
Ter essa coragem de ser você; se conhecer, se respeitar, se impor, ser sua própria advogada, sem esperar essa reafirmação alheia, pode te fazer ser vista como, nossa, toda uma lista de adjetivos negativos! Como, sei lá, egoísta, grossa, raivosa, interesseira, mal amada, louca e por aí vai. Uma observação curiosa: muitas gênias são chamadas de geniosas. Já parou para pensar que isso acontece por não beneficiar quem te acusa? Ou talvez porque até gostariam, mas não conseguem fazer o mesmo.
Cheguei a conclusão que podem me chamar de má, de vilã, eu não ligo! Afinal, não estou prejudicando ninguém, inclusive eu mesma (não mais). Minha consciência está limpa. Eu chamo de ser livre, de ser a protagonista da minha própria história. Não, melhor ainda, de ser a escritora da minha própria história.
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Um pouquinho doida.
Um pouquinho não, na verdade, bastante!
Mas no melhor sentido, tá?
Usam bastante essa palavra para me descrever, creio que pela minha intensidade, minha espontaneidade, minha expressividade… Tenho imaginação de criança, estou sempre em meio a infinitas reflexões e questionamentos, e ah! Tem minha gaiatice também, como diria meu pai. E, quer saber, eu amo ser descrita assim porque é uma característica minha que chama atenção, que faz com que as pessoas sintam abertura para se aproximar, que queiram se aproximar. Que sintam que podem se soltar, que não serão julgadas por isso, mas acolhidas. É algo que traz leveza, diversão e alegria! E essa é uma marca que eu gostaria de deixar. Sei que tem pessoas que já se lembram de mim (e vão se lembrar quando eu me for) com carinho justamente pela minha loucura.
Sei também que tem gente que vai me olhar torto por isso.
Eu acho que é besteira, porque somos todos loucos. Alguns só não transparecem. (Não sabem o que estão perdendo…)
Eu quero ser o mais louca possível!
Pensando bem, em vários sentidos. Lembrei que “mad” também pode significar “braba”.
Não tô falando de nada que, de novo, prejudique os outros ou a mim mesma, mas…
Sendo essa boba e palhaça; testando minhas ideias que soam nada a ver; sendo pioneira, revolucionando! Aceitando meu lado esquisito, transtornado e dramático; assumindo meus medos e vergonhas; liberando minhas sombras, minha raiva, minhas frustrações e indignações para poder direcionar para algo positivo — minha integração, meu crescimento, minha contribuição, como aconteceu no desfecho da Cruella.
Mas enfim, depois de tipo 3 textos em 1, o que eu quero dizer com tudo isso é: mulher, se aproprie de si mesma e da sua história também. Porque é sua e não existe ninguém melhor do que você para decidir como vivê-la melhor, como contá-la e aonde ela vai dar. ;)
Observações da autora: este texto foi escrito em Novembro de 2022.
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